quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

"Estórias para adormecer anjos"

O Caçador de Borboletas

"Vladimir recebeu muitas prendas de Natal, entre livros, discos, jogos de computador, mas gostou sobretudo do equipamento para caçar borboletas. O equipamento incluía uma rede, um frasco de vidro, algodão, éter, uma caixa de madeira com fundo de cortiça, e muitos alfinetes coloridos.
Nessa mesma tarde saiu para caçar borboletas.
Lançou a rede e viu a borboleta soltar-se da flor num voo curto e depois debater-se , já presa, nas malhas de nylon. Passou-a para o frasco e ficou um longo momento a olhar para ela.
- Agora és minha - disse-lhe -, toda a tua beleza me pertence.
- Isso não é possível- era a borboleta que falava.- Há certas coisas que não se podem guardar. Por exemplo, não podes guardar a luz do luar, ou a brisa perfumada de um pomar de macieiras. Não podes guardar as estrelas dentro de uma caixa. No entanto podes coleccionar estrelas. Escolhe uma quando a noite chegar. Será tua. Mas deixa-a guardada na noite. É ali o lugar dela.
Vladimir começava a achar que a borboleta tinha razão.
- Se eu te libertar agora - perguntou -, tu serás minha?
A borboleta fechou e abriu as asas iluminado o frasco com uma luz de todas as cores.
- Já sou tua - disse -, e tu já és meu. Sabes? Eu colecciono caçador de borboletas.
Vladimir regressou a casa alegre como um pássaro. O pai quis saber se ele tinha feito uma boacaçada. O menino mostrou-lhe com orgulho o frasco vazio:
- Muito boa - disse - Estás a ver? Deixei fugir a borboleta mais bela do mundo."

In Estranhões e Bizarrocos de José Eduardo Agualusa (texto com supressões)

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