segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

ITHACA de C.P. Cavafy dito por Sean Connery




ITHACA

As you set out for Ithaca
hope that your journey is a long one,
full of adventure, full of discovery.

Laistrygonians and Cyclops,
angry Poseidon - do not be afraid of them:
you'll never find things like that on your way
as long as you keep your thoughts raised high,
as long as a rare sensation
touches your spirit and your body.

Laistrygonians and Cyclops,
wild Poseidon - you won't encounter them
unless you bring them along inside your soul,
unless your soul sets them up in front of you.

Hope that your journey is a long one.
May there be many summer mornings when,
with what pleasure, what joy,
you come into harbors seen for the first time;
may you stop at Phoenician trading stations
to buy fine things,
mother of pearl and coral, amber and ebony,
sensual perfume of every kind -
as many sensual perfumes as you can;
and may you visit many Egyptian cities
to learn and learn again from those who know.

Keep Ithaca always in your mind.
Arriving there is what you're destined for.
But do not hurry the journey at all.
Better if it lasts for years,
so that you're old by the time you reach the island,
wealthy with all you have gained on the way,
not expecting Ithaca to make you rich.

Ithaca gave you the marvelous journey.
Without her you would not have set out.
She has nothing left to give you now.

And if you find her poor, Ithaca won't have fooled you.
Wise as you will have become, so full of experience,
you will have understood by then what these Ithacas mean.

 C.P. Cavafy

Let it snow | Diane Krall

If de Rudyard Kipling

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Inquietação: há sempre qualquer coisa que está para acontecer




A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes

São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas

Não largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco para chegar
Eu não meti o barco ao mar
Pra ficar pelo caminho

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Cá dentro inqueitação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda


Inquietação de José Mário Branco | A NAIFA

sábado, 21 de dezembro de 2013

Inverno: Sputnik, meu Amor

A leitura de Sputnik meu Amor  foi interrompida pelo outono. Poucos romances me entusiasmam, infelizmente! Comecei a lê-lo na aldeia de Minas de São Domingos, onde o verão é mais quente e as férias convidam a este prazer, entre um banho na tapada e uma sesta. Hoje, dia em que começa o inverno e as noites são longas e frias, retomo a sua leitura.

"O gelo é frio e as rosas são vermelhas. Estou apaixonada. E este amor vai arrastar-me para longe. A corrente é demasiado forte, não tenho escolha possível. Mas já não posso voltar atrás. Só posso deixar-me ir com a maré. Mesmo que comece a arder, mesmo que desapareça para sempre."  Lê-se na contracapa da 3ª edição da Casa das Letras.



segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Fora de tempo | Luisa Sobral




Fora de tempo

Fora de tempo pôs-se o sol
e a lua fora de tempo também
fora de tempo nasceram dois
filhos da mesma mãe

Fora de tempo brotaram da terra
flores e espinhos também
fora de tempo ficaram longe
mais longe do que convém

Fora de tempo o que era quente
gelou até matar tudo
se um cantava no silêncio
fora de tempo ouviu-se um grito mudo

O tempo também se engana
nas casas onde mora
o mau tempo que faz dentro
nem sempre é tão bom de fora

Fora de tempo o que era água
teimou em ser areal
fora de tempo já se notava
que um vê bem e o outro mal

Fora de tempo tudo voltou
ao tempo que era atrás
e dentro do tempo um partiu mais cedo
e o outro ficou para amar

Letra de Luis Represas

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Solo sé que no sé nada | Rodrigo Leão e Daniel Melingo



No sé nada

Querido amigo, yo no sé, nada
Solo sé, que a la hora de jugar, igual a la hora de llorar
No sé nada, de nada
Yo sé que hoy, no pueden pedirme nada
Porque hoy, es el gran día
El día de la Paz, y la Felicidad

Solo sé que no sé nada
Corazón batiendo fuerte
Sentimiento de viajen
Solo sé que no sé nada

Tierra bendita, tierra linda!
Mi corazón está ay, donde debe estar
Batiendo fuerte en el pecho
Llegará mi cuerpo, llegará mi cuerpo
Después mi alma, pero sabiendo solo una cosa
Que nada Sé
Mi querido camarada, le envío un gran saludo
Recordando solo una cosa. Ya la sabe, no?

Solo sé que no sé nada
Corazón batiendo fuerte
Sentimiento de viajen
Solo sé que no sé nada

Música de Rodrigo Leão e letra de Daniel Melingo

Às vezes o amor | Márcia



Que hei-de eu fazer
Eu tão nova e desamparada
Quando o amor
Me entra de repente
P´la porta da frente
E fica a porta escancarada

Vou-te dizer
A luz começou em frestas
Se fores a ver
Enquanto assim durares
Se fores amada e amares
Dirás sempre palavras destas

P´ra te ter
P´ra que de mim não te zangues
Eu vou-te dar
A pele, o meu cetim
Coração carmesim
As carnes e com elas sangues

Às vezes o amor
No calendário, noutro mês, é dor,
é cego e surdo e mudo

E o dia tão diário disso tudo

E se um dia a razão
Fria e negra do destino
Deitar mão
À porta, à luz aberta
Que te deixe liberta
E do pássaro se ouça o trino

Por te querer
Vou abrir em mim dois espaços
P´ra te dar
Enredo ao folhetim
A flor ao teu jardim
As pernas e com elas braços

Às vezes o amor
No calendário, noutro mês, é dor,
É cego e surdo e mudo

E o dia tão diário disso tudo

Mas se tudo tem fim
Porquê dar a um amor guarida
Mesmo assim
Dá princípio ao começo
Se morreres só te peço
Da morte volta sempre em vida

Às vezes o amor
No calendário, noutro mês é dor,
É cego e surdo e mudo

E o dia tão diário disso tudo
Da morte volta sempre em vida

poema de Sérgio Godinho

sábado, 7 de dezembro de 2013

A canção do tempo | Ary dos Santos



A canção do tempo

Para um tempo que fica
Doendo por dentro
E passa por fora
Para o tempo do vento
Que é o contratempo
Da nossa demora

Passam dias e noites
Os meses...os anos
O segundo e a hora
E ao tempo presente
É que a gente pergunta
E agora...e agora

Tempo
Para pensar cada momento deste tempo
Que cada dia é mais profundo e é mais tempo
Para emendar pois outro tempo menos lento

Tempo
Dos nossos filhos aprenderem com mais tempo
A rapidez que apanha sempre o pensamento
Para nascer, para viver, para existir
E nunca mais verem o tempo fugir

Ai...o tempo constante
Que a cada instante
Nos passa por fora
Este tempo candente
Que é como um cometa
Com laivos de aurora

É o tempo de hoje
É o tempo de ontem
É o tempo de outrora
Mas o tempo da gente
É o tempo presente
É agora...é agora

Tempo
Para agarrar cada momento deste tempo
E terminar em absoluto ao mesmo tempo
Em temporal como os ponteiros do minuto

Tempo
Para o relógio bater certo com a vida
Que um homem bom que um homem são que um homem forte
Que não chegava a conseguir fazer partida
E que desperta adiantado para a morte

Ary dos Santos

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Madiba | I am the master of my fate: / I am the captain of my soul




Invictus por Morgan Freeman

Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find, me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll.
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.

William Ernest Henley

O meu lado esquerdo é mais forte do que o outro | CLÃ



O meu lado esquerdo
é mais forte do que o outro
é o lado da intuição
É o lado onde mora o coração

O meu lado esquerdo
Oriente do meu instinto
É o lado que me guia no escuro
É o lado com que eu choro e com que eu sinto

Meu é o meu foi o meu lado esquerdo
Que me levou até ti
Quando eu já pensava
Que não existias para mim no mundo

O meu lado esquerdo não sabe o que é a razão
É ele que me faz sonhar
É ele que tantas vezes diz não

 Meu é o meu foi o meu lado esquerdo
Que me levou até ti
Quando eu já pensava
Que não existias para mim no mundo

 Clã

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

domingo, 1 de dezembro de 2013

O caçador de borboletas | José Eduardo Agualusa

"(...)
- Agora és minha - disse-lhe -, toda a tua beleza me pertence.

- Isso não é possível- era a borboleta que falava.- Sabes como surgiram as borboletas? Foi há muito, muito tempo, na Índia. Vivia então ali um homem sábio e bom, chamado Buda ...
Vladimir esfregou os olhos:
- Meu Deus, estou a sonhar?

A borboleta riu-se:
- Isso não tem importância. Ouve a minha história. Buda, o tal homem sábio e bom, achou que faltava alegria ao ar. Então colheu uma mão cheia de flores e lançou-as ao vento e disse: voem! E foi assim que surgiram as primeiras borboletas. A beleza das borboletas é para ser vista no ar, entendes? É uma beleza para ser voada.

- Não! - disse Vladimir abanando a cabeça. - Eu sou um caçador de borboletas. As borboletas nascem, voam e morrem, e se não forem os colecionadores, como eu, desaparecem para sempre.
A borboleta riu-se de novo (um riso calmo, como um regato correndo ...)

- Estás enganado. Há certas coisas que não se podem guardar. Por exemplo, não podes guardar a luz do luar, ou a brisa perfumada de um pomar de macieiras. Não podes guardar as estrelas dentro de uma caixa. No entanto podes colecionar estrelas. Escolhe uma quando a noite chegar. Será tua. Mas deixa-a guardada na noite. É ali o lugar dela.

Vladimir começava a achar que a borboleta tinha razão.
- Se eu te libertar agora - perguntou -, tu serás minha?
A borboleta fechou e abriu as asas iluminado o frasco com uma luz de todas as cores.
- Já sou tua - disse -, e tu já és meu. Sabes? Eu coleciono caçadores de borboletas.

Vladimir regressou a casa alegre como um pássaro. O pai quis saber se ele tinha feito uma boa caçada. O menino mostrou-lhe com orgulho o frasco vazio:

- Muito boa - disse - Estás a ver? Deixei fugir a borboleta mais bela do mundo."

in Estranhões & Bizarrocos (estórias para adormecer anjos) de José Eduardo Agualusa. Ilustrado por Henrique Cayatte.

Teoria Geral do Sentimento | Nuno Júdice

sábado, 30 de novembro de 2013

Parabéns Toni Carreira!



2013: Tony Carreira comemora 25 anos de uma carreira cheia de sucessos!

domingo, 24 de novembro de 2013

Toca-me, sem uma palavra / só a tua pele, e a tua alma | UHF

A banda da margem sul*, UHF, festeja este ano 35 anos de existência, os quais eu fui distraidamente acompanhando. Proponho-vos esta bonita canção, para ouvirem atentamente! 




* margem sul: de onde se vê a lua.


Toca-me

Toca-me, sem uma palavra
só a tua pele, e a tua alma

Toca-me, o tempo vai
movendo a luz, do meu olhar

Toca-me, que tenho medo
pode o amor, guardar segredo

Toca-me, nesta penumbra
depois de ti, a noite dura

Toca-me, meu amor

Toca-me, sem uma palavra
só a tua pele, e a tua alma

Toca-me, meu amor

de António Manuel Ribeiro

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O tempo é meu amigo | UHF



letra de António Manuel Ribeiro

Fotografia de Madrid | José Luis Peixoto

Madrid regressará sempre. São precisos anos
para aprender aquilo que apenas acontece com
a distância de anos. É por isso que posso afirmar
que Madrid regressará sempre. Não sei que tipo
de entendimento encontrámos. Eu e Madrid não
nos conhecemos bem. Sabemos o essencial e
inventamos tudo o resto. Tanto a minha vida,
como a vida de Madrid, já tiveram muitas formas.
No entanto, quando nos encontramos, somos
sempre o mesmo nome. Avaliamo-nos por
cicatrizes e pequenas marcas de idade.
Não estabelecemos metas, estamos cansados.
Eu e Madrid só queremos uma cama, mas,
se não houver, contentamo-nos com o chão e,
se não houver, contentamo-nos com um abraço.

José Luis Peixoto, Fotografia de cidades

terça-feira, 19 de novembro de 2013

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Enquanto dura esta hora, este luar, esta paz ... | Ricardo Reis

Sim, sei bem
Que nunca serei alguém.
Sei de sobra
Que nunca terei uma obra.
Sei, enfim,
Que nunca saberei de mim.
Sim, mas agora,
Enquanto dura esta hora,
Este luar, estes ramos,
Esta paz em que estamos,
Deixem-me crer
O que nunca poderei ser.

Ricardo Reis

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Ternura de David Mourão Ferreira | Luis Cília

Desvio dos teus ombros o lençol
Que é feito de ternura amarrotada
Da frescura que vem depois do sol
Quando depois do sol não vem mais nada.

Olho a roupa no chão - que tempestade
Há restos de ternura pelo meio
Como vultos perdidos na cidade
Onde uma tempestade sobreveio.

Começas a vestir-te lentamente
E é ternura também que vou vestindo
Para enfrentar lá fora aquela gente
Que da nossa ternura anda sorrindo.

Mas ninguém sabe a pressa com que nós
A despimos assim que estamos sós.

David Mourão Ferreira


O que tenho para te dar? Nada, e tudo. | Nuno Júdice

OFERTA

O que tenho para te dar? Uma gramática de sentimentos,
verbos sem o complemento de uma vida, os substantivos
mais pobres de um vocabulário íntimo — o amor, o desejo,
a ausência. Que frase construiremos com tão pouco? A
que léxico da paciência iremos roubar o que nos falta?

Então, ofereço-te uma outra casa. As paredes têm a
consistência do verso; o teto, o peso de uma estrofe.
Abro-te as suas portas; e o sol entra pela janela de
uma sílaba, com o seu logo vocálico, como se uma
palavra pudesse aquecer o frio que te envolve.

E pergunto-te: que outras palavras queres? A música
sonora de um ócio? O espesso manto com que o veludo
se escreve? O fundo luminoso do azul? Poderia dar-te
todas as palavras na caixa do poema; ou emprestar-te
o canto efémero em que se escondem do mundo.

Mas não é isso que me pedes. E a vida que pulsa
por entre advérbios e adjectivos esfuma-se depressa,
quando procuramos seguir a linha do verso, O que fica?,
perguntas-me. Um encontro no canto da memória. Risos,
lágrimas, o terno murmúrio da noite. Nada, e tudo.


Nuno Júdice, in "O Estado dos Campos"

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

A praia | Sophia de Mello Breyner Andersen

"O nevoeiro tinha transfigurado tudo.
Agora só cheirava a mar. Um perfume apaixonado de algas escorria das árvores. Lua e estrelas não se viam. Nem os plátanos se viam. Só se viam muros brancos no nevoeiro branco. Tudo estava imóvel e suspenso.
Só a voz do mar se ouvia, espantosamente real, recriando-se incessantemente.
E parecia que os grandes, verdes e violentos espaços marinhos, como sendo o nosso próprio destino, nos chamavam."


Final do conto A praia de Sophia 

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Sophia por Arpad Szenes



Sophia e Arpad, duas paixões ... minhas!

domingo, 3 de novembro de 2013

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Sou o sul quieto das areias ...

"Sou o sul quieto das areias, o voo rasteiro do vento, o canto que o passado esconde sem quando e sem onde. Sou o eco nas paredes do Mayombe"

Paredes do Mayombe

Kalimba afinada em sol | Aline Frazão


Palamé | Aline Frazão, Gari Sinedima, Irina Vasconcelos e Toty Sa' Med

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Talvez digas um dia o que me queres ... | Carminho e Luis Guerreiro



Talvez

Talvez digas um dia o que me queres,
Talvez não queiras afinal dizê-lo,
Talvez passes a mão no meu cabelo,
Talvez eu pense em ti talvez me esperes.

Talvez, sendo isto assim, fosse melhor
Falhar-se o nosso encontro por um triz
Talvez não me afagasses como eu quis,
Talvez não nos soubéssemos de cor.

Mas não sei bem, respostas não mas dês.
Vivo só de murmúrios repetidos,
De enganos de alma e fome dos sentidos,
Talvez seja cruel, talvez, talvez.

Se nada dás, porém, nada te dou
Neste vaivém que sempre nos sustenta,
E se a própria saudade nos inventa,
Não sei talvez quem és mas sei quem sou.

Se nada dás, porém, nada te dou
Neste vaivém que sempre nos sustenta,
E se a própria saudade nos inventa,
Não sei talvez quem és mas sei quem sou.

Letra: Vasco Graça Moura
Música: Mário Pacheco


terça-feira, 22 de outubro de 2013

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Kabul está branca, hoje. De esperança. | António Rodrigues

"Como eu lamento que sem mim os dias passem, as flores desabrochem e a Primavera venha; Invernos e estios e as Primaveras hão-de passar, e eu nada mais sou senão terra e pó.” (‘Abdul-Rahman Jami).

Neva em Kabul. O pó assentou. Por via disso, esta madrugada já se respira melhor. E cheira a terra húmida, a terra porejada do deserto, e a flores cor-de-rosa e amarelas, repousadas. Assim que pela aurora os revérberos do sol despontaram no horizonte, logo se ouviu ao perto, neste bastião cercado de muralhas, a desfraldar e a adensar o ar chamando as pessoas para o centro desta maravilha, a candente e harmoniosa musicalidade do “mu’addin”, no topo das soberbas mesquitas que se erguem aos céus, severamente elegantes, para deleite dos olhos da alma retemperada. “Ashhadu an la ilaha ill Allah!” (“Não há outra divindade senão Deus!”), ressoa nos minaretes. Paraísos do crescente verde.

Hoje é sexta-feira, “al-jumu’a”, dia santo para o Islão. É dia de orações. E dia de mercado ao ar livre, no meio do campo, à beira da estrada, entre camiões e camionetas a abarrotar de gentes, petizes travessos a correrem sem direcção certa, nos trilhos de terra batida para os carros, meninos que não foram dados pelas mães, alguns descalços nas pedras e no gelo, anciãos de longas barbas brancas com bebés ao colo, buganvílias, ceitis, antiguidades dos lados de lá das fronteiras, despojos de outras guerras, aromas adocicados, rolos de tapetes e sacas abertas de especiarias, lojistas indolentemente recostados a pilhas de almofadas bordadas, que acenam, regateiam preços, levantam o canto das mantas exibindo o intrincado trabalho manual e convidam a entrar nos seus bazares. Dois homens, de característica uzbeque, constroem uma casa, tijolo sobre tijolo. Há mulheres a lavar roupa nos pátios. Frenesim, constantes idas e vindas, transportes e trocas, carga, lã, metais, açafrão, tâmaras, panos, pregões, ruídos, exotismo, cestos de laranjas, incenso, ar húmido, eflúvios a cardamomo, sedas, adargas, cobres, frutas, bijutarias e oiro, lírios, açucenas e perfumes inebriantes e particulares a jasmim e a menta, cabras, ovelhas, cavalos, vacas escanzeladas, galinhas e patos, afundados na lama onde vão ter as águas das lavagens que correm, em regos, no meio da rua.

As crianças pululam em nosso redor. E fazem muitas perguntas. Saudamo-las com um sorriso e um “Ba’dan mêbinêm, insha’Allah” (“Até já, assim queira Deus”). Abdullah, moreno, magro, cabelo curto e espetado, sorriso jovial, olhos meio em bico, chama-nos para a sua “shop”, onde vende peças de artesanato e oferece recordações a quem por lá parar e, com ele, partilhar um copo de chá verde. “Come on my friend, man dar dôkân kâr. Good price for you”.

Tropeçando um bocadinho nas palavras, diz-nos que um dia o Afeganistão atingirá de novo a sua beleza. Enleio-me nesse entusiasmo e reflicto na poesia factível desta terra. Deste palmar perdido. É preciso pisar o ancestral solo desta nação, afagar as pedras e contemplar essas muralhas de terracota, espessas como o tempo, arcadas de terra cozida, voltadas a sul, muros encimados por ameias em dentes de serra, feitos de areia granulada, estrume, barro, escorpiões mortos e do suor de gerações, eternos murmúrios do passado, testemunhos de tamanhos sofrimentos e tantos actos de abnegação e heroísmo, para nos sentirmos pequenos ao recordar a grandeza dos que a conquistaram, construíram e defenderam. Guerreiros, místicos e eruditos, de quem recrio e invento mentalmente os seus passos de descoberta, percorrendo o país de lado a lado, em latitude e longitude.

Não há dúvida que é um país estranho e complexo este, que desperta a atenção, emociona e enamora a curiosidade, e onde felizmente se pode, ainda hoje, ver um mundo de ontem pois que raros domínios possuirão uma tão forte originalidade, genuinidade, erudição e tanta riqueza de raças, multiplicidade e contrastes na história, nos ecos, nos costumes, nas fácies, nos trajes, nas glórias, nas lágrimas vertidas, na paisagem e na textura. Aqui, até as árvores falam uma língua diferente.

Abdullah tem 24 anos e é de Bamiyan, a cerca de 150 quilómetros a oeste de Kabul, a capital afegã. A cidade de Bamiyan, no centro do país, tornou-se lamentavelmente mais do que nunca conhecida depois que, em Março de 2001, a milícia “taliban” decidiu destruir as estátuas dos maiores budas de pé existentes no mundo, datadas do ano 500, esculpidas na rocha vermelha de uma escarpa abrupta, uma com aproximadamente 55 metros e a outra com 38 metros de altura, por alegadamente representarem um deus Hindu, “um deus dos infiéis”, conforme redigido na “fatwa”ou “decreto religioso”, então aprovado pelos líderes religiosos e pela “suprema corte taliban”. Nos traços desses budas, o rigor da Grécia coexistia com a espiritualidade hindu, expressando atitudes diferentes perante a vida numa mescla cativante do encontro de culturas, de mundividências, de cosmogonias tão distantes como a greco-bactriana, a kuchana, a budista, a dos guptas da Índia e a dos sassânidas persas. De comum, o Deus-Sol que fundia três simbolismos: o do grego Helios, o do persa Mitra, o do indiano Surya. A iconografia perturbava e comovia o forasteiro.

Apesar de terem sido invocados motivos de ordem religiosa, a verdade é que, quando o primeiro exército árabe atravessou a cordilheira do Hindu Kush rumo à Índia e avançou para Oriente ao encontro dos chineses (a quem derrotou na batalha de Talas) ignorou a existência das estátuas de Bamiyan, obras primas do período tardio da chamada “Arte de Gandhara”, uma escola que nasceu no actual Afeganistão e no norte da Índia (hoje Paquistão) que atingiu o apogeu nos dois primeiros séculos da nossa era, quando essas regiões estavam integradas no Império Kuchano, e que desempenhou na época o papel de intermediário no comércio entre a Roma dos Antoninos e a China dos Han. Foi idêntica a atitude das sucessivas dinastias muçulmanas que dominaram a região, desde os samanidas aos turcos gahznividas, que sempre reputaram os budas gandharianos, uma maravilhosa adaptação da arte grega com a uma concepção religiosa do mundo antagónica ao paganismo dionisíaco dos helenos. E até o mongol Gengis Khan, responsável pelos maiores genocídios da Idade Média, transcorridos cinco séculos, ordenou que todos os seres vivos (incluindo cães e gatos) fossem destruídos no vale apertado entre píncaros de Bamiyan. Mas os budas foram poupados...

(...) Lusco-fusco. Recortam-se no céu as estrelas e a meia lua. Quarto crescente. Sombras, aninhadas aqui e acolá, revelam meninas reinadias, brincando inocentemente. Ensaiam um boneco de neve, o “adamak-e barfi”, celebrando a vida com alegria e canções trazidas no vento. Luas ou anjos, não sei o que seriam realmente as coisas que via. E, ali mesmo, pergunto-me, até quando as intolerâncias serôdias, as políticas bizantinas e as asininas guerras persistirão em inquinar as cores celestes da paz e aluir prematuramente a sublime beatitude divina da criação.

Kabul está branca, hoje. De esperança.

O blogueiro de Kabul  de António Rodrigues

domingo, 13 de outubro de 2013

Deixei na primavera o som do encanto



Até ao verão | Ana Moura

Deixei
na primavera o cheiro a cravo
rosa e quimera que me encravam na memória que inventei

e andei
como quem espera
pelo fracasso
contra mazela em corpo de aço
nas ruelas do desdém

e a mim que importa
se é bem ou mal
se me falha a cor da chama a vida toda
é-me igual

vi sem volta
queira eu ou não
que me calhe a vida
insane e vossa em boda
até ao verão

deixei na primavera o som do encanto
rica promessa e sono santo
já não sei o que é dormir bem

e andei pelas favelas
do que eu faço
ora tropeço em erros crassos
ora esqueço onde errei

e a mim que importa
se é bem ou mal
se me falha a cor da chama a vida toda
é-me igual

vi sem volta
queira eu ou não
que me calhe a vida
insane e vossa em boda
até ao verão

e a mim que importa
se é bem ou mal
se me falha a cor da chama a vida toda
é-me igual

vi sem volta
queira eu ou não
que me calhe a vida
insane e vossa em boda
até ao verão

Letra e música de Márcia Santos

Não sei tecer senão espumas, nuvens e brumas. Coisas breves, leves, ...

que o vento desfaz.
(...)


Luisa Dacosta

Além da grande incerteza de não estar certa de nada



DESFADO

Quer o destino que eu não creia no destino
E o meu fado é nem ter fado nenhum
Cantá-lo bem sem sequer o ter sentido
Senti-lo como ninguém, mas não ter sentido algum

Ai que tristeza, esta minha alegria
Ai que alegria, esta tão grande tristeza
Esperar que um dia eu não espere mais um dia
Por aquele que nunca vem e que aqui esteve presente

Ai que saudade
Que eu tenho de ter saudade
Saudades de ter alguém
Que aqui está e não existe
Sentir-me triste
Só por me sentir tão bem
E alegre sentir-me bem
Só por eu andar tão triste

Ai se eu pudesse não cantar "ai se eu pudesse"
E lamentasse não ter mais nenhum lamento
Talvez ouvisse no silêncio que fizesse
Uma voz que fosse minha cantar alguém cá dentro

Ai que desgraça esta sorte que me assiste
Ai mas que sorte eu viver tão desgraçada
Na incerteza que nada mais certo existe
Além da grande incerteza de não estar certa de nada

Autor: Pedro da Silva Martins

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Estou vivo e escrevo sol | António Ramos Rosa


Eu escrevo versos ao meio-dia
e a morte ao sol é uma cabeleira
que passa em frios frescos sobre a minha cara de vivo
Estou vivo e escrevo sol

Se as minhas lágrimas e os meus dentes cantam
no vazio fresco
é porque aboli todas as mentiras
e não sou mais que este momento puro
a coincidência perfeita
no acto de escrever sol

A vertigem única da verdade em riste
a nulidade de todas as próximas paragens
navego para o cimo
tombo na claridade simples
e os objectos atiram as suas faces
e na minha língua o sol trepida

melhor que beber vinho é mais claro
ser no olhar o próprio olhar
a maravilha é este espaço aberto
a rua
um grito
a grande toalha do silêncio verde

António Ramos Rosa

domingo, 22 de setembro de 2013

L´AUTOMNE = L' ETE INDIEN




Nous marchions sur une plage un peu comme celle-ci
C'était l'automne, un automne où il faisait beau
Une saison qui n'existe que dans le Nord de l'Amérique
Là-bas on l'appelle l'été indien
Mais c'était tout simplement le nôtre
Avec ta robe longue tu ressemblais
A une aquarelle de Marie Laurencin
Et je me souviens, je me souviens très bien
De ce que je t'ai dit ce matin-là
Il y a un an, y a un siècle, y a une éternité

On ira où tu voudras, quand tu voudras
Et on s'aimera encore, lorsque l'amour sera mort
Toute la vie sera pareille à ce matin
Aux couleurs de l'été indien

Aujourd'hui je suis très loin de ce matin d'automne
Mais c'est comme si j'y étais. Je pense à toi.
Où es-tu? Que fais-tu? Est-ce que j'existe encore pour toi?
Je regarde cette vague qui n'atteindra jamais la dune
Tu vois, comme elle je reviens en arrière
Comme elle je me couche sur le sable
Et je me souviens, je me souviens des marées hautes
Du soleil et du bonheur qui passaient sur la mer
Il y a une éternité, un siècle, il y a un an

On ira où tu voudras, quand tu voudras
Et on s'aimera encore lorsque l'amour sera mort
Toute la vie sera pareille à ce matin
Aux couleurs de l'été indien

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

... e pur si muove




















"Foi então que vi o pêndulo.
A esfera, móvel na extremidade de um longo fio fixado na abóbada do coro, descrevia as suas amplas oscilações com isócrona majestade ."

O Pêndulo de Foucault de Umberto Eco

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

E neste verão ...



O que me refrescou? 

Uma chuvada forte numa tarde de final de agosto onde o verão é mais quente;

Uma bebida com muito gelo partilhado em momentos sem tempo e sem lugar;

As águas frias do mar onde me banhei.

Quem me alegrou? 

As pessoas com quem eu partilhei estes e muitos outros momentos.



sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Cuca Roseta e Cordis + Opus Quatro | Fado do Perdão

Letra de Cuca Roseta e música de André Sardet

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Mariza e Concha Buika | Pequenas Verdades



No meu deserto de água
Não havia luz para te olhar
Tive que roubar a lua
Para te poder iluminar

Quando iluminei o teu rostro
Fez-se dia no meu corpo
Enquanto eu te iluminava
Minha alma nascia de novo

São as pequenas verdades
As que guiam o meu caminho
Verdades brancas
Como a manhã
Que abre janela do nosso destino
Como o teu olhar
Quando tu me olhas
Como a tua lembrança
Depois de partires

É verdade que a sombra do ar me queima
É verdade que sem ti eu morro de pena


Misteriosa era tu boca
Misterioso mi lamento
Aün no se si nuestro amor de primavera
Fue verdad o sólo el sueño de cualquiera
Cuando la soledad regrese
Ciega de amor me iré a la muerte
Las verdades sólo existen
En rincones de la mente
Esas pequeñas verdades que guiaron mi camino
Verdades blancas como la mañana
Que abre la ventana de nuestro destino
Como tu miradacuando tu me miras
Como tu recuerdo
cuando ya te has ido

Es verdad que la sombra del aire me quema
Ay es verdad que sin ti yo me muero de pena
Compositor: Javier Limón


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

domingo, 18 de agosto de 2013

Boss AC & Gabriel O Pensador | Um Brinde à Amizade

Para um amigo | António Ramos Rosa

Para um amigo tenho sempre um relógio
esquecido em qualquer fundo de algibeira.
Mas esse relógio não marca o tempo inútil.
São restos de tabaco e de ternura rápida.
É um arco-íris de sombra, quente e trémulo.
É um copo de vinho com o meu sangue e o sol.

António Ramos Rosa, in "Viagem Através de uma Nebulosa"

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Tom Waits diz Charles Bukowski: "The Laughing Heart"



 The Laughing Heart

Your life is your life
don't let it be clubbed
 into dank submission.

 Be on the watch.
There are ways out.
There is a light somewhere.

 It may not be much light
 but it beats the darkness.
 Be on the watch.
The gods will offer you chances.
Know them.
Take them.

You can't beat death
 but you can beat death in life,
 sometimes.

And the more often you learn to do it,
the more light there will be.
Your life is your life.
Know it while you have it.
You are marvelous
the gods wait to delight
in you.

Charles Bukowski

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Um outro poema de amor | Nuno Júdice

Um outro poema de amor

No fundo, as relações entre mim e ti
cabem na palma da mão:
onde o teu corpo se esconde e
de onde,
quando sopro por entre os dedos,
foge como fumo
um pequeno pássaro,
ou um simples segredo
que guardávamos para a noite.

Nuno Júdice

Tudo o que eu te dou | Pedro Abrunhosa




Num palco perto de si, algures, neste verão!

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Urbano Tavares Rodrigues | Primavera

Primavera

A Primavera vem dançando
com os seus dedos de mistério e turquesa
Vem vestida de meio dia e vem valsando
entre os braços dum vento sem firmeza

Nu como a água o teu corpo quieto e ausente
Só este inquieto esvoaçar do teu sorriso
Loiro o rosto o olhar não sei se mente
se de tão negro e parado é um aviso
do destino que me fixa finalmente

Ai, a Primavera vai passando
com os seus dedos de mistério e de turquesa
Segue Primavera vai cantando
Que será do nosso amor nesta praia de incerteza

Urbano Tavares Rodrigues

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

ÍCARO | Adriana Queiroz e Luanda Cozetti



ÍCARO de Pedro Jóia. Do álbum Ariadne de Adriana Queiroz


Sonhou que voava
num céu tão alto
para lá do azul
tinha asas de aventura, ilusão

Foi sem muito jeito
encheu o peito
saltou no azul
deixou lá em baixo o medo
junto ao chão

Quem te disse
que era esse lugar feito para ti
pássaro sem asas
de um sonho proibido

Mas se tu voares
para esse lugar
sabe que eu também vou junto
leva-me contigo

Ícaro alado,
quem te derrubou?
Com asas de cera
ave que não era
foi um sol ardente
que ninguém imaginou

Nota: a forma de apresentar o poema, assim como a respetiva pontuação foi feita pela editora deste blogue.

terça-feira, 30 de julho de 2013

Eunice Muñoz e Pedro Lamares dizem Ruy Belo



Eunice Munoz e Pedro Lamares dizem Ruy Belo, 2011

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Aconteceu-me | Almada Negreiros

Eu vinha de comprar fósforos
e uns olhos de mulher feita
olhos de menos idade que a sua
não deixavam acender-me o cigarro.
Eu era eureka para aqueles olhos.
Entre mim e ela passava gente como se não passasse
e ela não podia ficar parada
nem eu vê-la sumir-se.
Retive a sua silhueta
para não perder-me daqueles olhos que me levavam espetado
E eu tenho visto olhos !
Mas nenhuns que me vissem
nenhuns para quem eu fosse um achado existir
para quem eu lhes acertasse lá na sua ideia
olhos como agulhas de despertar
como íman de atrair-me vivo
olhos para mim!
Quando havia mais luz
a luz tornava-me quase real o seu corpo
e apagavam-se-me os seus olhos
o mistério suspenso por um cabelo
pelo hábito deste real injusto
tinha de pôr mais distância entre ela e mim
para acender outra vez aqueles olhos
que talvez não fossem como eu os vi
e ainda que o não fossem, que importa?
Vi o mistério!
Obrigado a ti mulher que não conheço.

domingo, 28 de julho de 2013

sábado, 27 de julho de 2013

Reconhecimento à Loucucura | Almada Negreiros

Já alguém sentiu a loucura
vestir de repente o nosso corpo?
Já.
E tomar a forma dos objectos?
Sim.
E acender relâmpagos no pensamento?
Também.
E às vezes parecer ser o fim?
Exactamente.
Como o cavalo do soneto de Ângelo de Lima?
Tal e qual.
E depois mostrar-nos o que há-de vir
muito melhor do que está?
E dar-nos a cheirar uma cor
que nos faz seguir viagem
sem paragem
nem resignação?
E sentirmo-nos empurrados pelos rins
na aula de descer abismos
e fazer dos abismos descidas de recreio
e covas de encher novidade?
E de uns fazer gigantes
e de outros alienados?
E fazer frente ao impossível
atrevidamente
e ganhar-Ihe, e ganhar-Ihe
a ponto do impossível ficar possível?
E quando tudo parece perfeito
poder-se ir ainda mais além?
E isto de desencantar vidas
aos que julgam que a vida é só uma?
E isto de haver sempre ainda mais uma maneira pra tudo?

Tu Só, loucura, és capaz de transformar
o mundo tantas vezes quantas sejam as necessárias para olhos individuais
Só tu és capaz de fazer que tenham razão
tantas razões que hão-de viver juntas.
Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta.
Só tu tens asas para dar
a quem tas vier buscar

Almada Negreiros

terça-feira, 23 de julho de 2013

Com que voz chorarei meu triste fado | Amália Rodrigues




Com que voz chorarei meu triste fado,
que em tão dura paixão me sepultou.
que mor não seja a dor que me deixou
o tempo, de meu bem desenganado.

Mas chorar não estima neste estado
aonde suspirar nunca aproveitou.
Triste quero viver, pois se mudou
em tisteza a alegria do passado.

Assim a vida passo descontente,
ao som nesta prisão do grilhão duro
que lastima ao pé que a sofre e sente.

De tanto mal, a causa é amor puro,
devido a quem de mim tenho ausente,
por quem a vida e bens dele aventuro.

Soneto de Luís Camões, música de Alain Oulman

Almada Negreiros



Mapa celeste de Almada Negreiros | Gravuras incisas no pórtico da FLUL

sábado, 20 de julho de 2013

L'amitié: la plus belle saison des quatre de la Terre



L'amitié

Beaucoup de mes amis sont venus des nuages
Avec soleil et pluie comme simples bagages
Ils ont fait la saison des amitiés sincères
La plus belle saison des quatre de la Terre

Ils ont cette douceur des plus beaux paysages
Et la fidélité des oiseaux de passage
Dans leurs cœurs est gravée une infinie tendresse
Mais parfois dans leurs yeux se glisse la tristesse

Alors, ils viennent se chauffer chez moi
Et toi aussi, tu viendras
Tu pourras repartir au fin fond des nuages
Et de nouveau sourire à bien d'autres visages

Donner autour de toi un peu de ta tendresse
Lorsqu'un autre voudra te cacher sa tristesse
Comme l'on ne sait pas ce que la vie nous donne
Il se peut qu'à mon tour je ne sois plus personne

S'il me reste un ami qui vraiment me comprenne
J'oublierai à la fois mes larmes et mes peines
Alors, peut-être je viendrai chez toi
Chauffer mon cœur à ton bois

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Eu e Almada Negreiros

Almada Negreiros está presente nos três edifícios emblemáticos da cidade universitária: Faculdade de  Letras à direita, solarenga, multicultural e colorida; Faculdade de  Direito, à esquerda, escura, soturna e fria*; a reitoria, ao centro, imponente, onde os nossos passos ecoavam ... 

Se um dia passarem por lá não deixem de reparar nas gravuras incisas que se encontram nas entradas destes edifícios, todos da sua autoria. Essencial documentar-se, aquiaqui e ainda aqui !

Tive o privilégio de conviver diariamente, talvez de uma forma um pouco leviana, com estas figuras durante quatro anos, neste espaço de saber essencial para a educação do meu gosto ou se preferirem sentido estético.

Gravuras incisas de Almada - pórtico da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

* não estou a exagerar nem a ser parcial, era mesmo assim!! As filas de placards cheios de pautas de notas de frequências e de exames eram o cartão de visita  de  quem entrava naquele espaço. Imagem que contrastava com a sua vizinha do lado, cujo átrio se enchia de placards com cartazes alusivos a eventos de cariz cultural! Opostas, em espelho, cada uma com a(s) sua(s) singularidade(s) mas ambas notáveis!

terça-feira, 16 de julho de 2013

Mariza e Tito Paris | Beijo de Saudade




Ondas sagradas do Tejo
Deixa-me beijar as tuas águas
Deixa-me dar-te um beijo
Um beijo de mágoa
Um beijo de saudade
Para levar ao mar e o mar à minha terra

Nas tuas ondas cristalinas
Deixa-me dar-te um beijo
Na tua boca de menina
Deixa-me dar-te um beijo, óh Tejo
Um beijo de mágoa
Um beijo de saudade
Para levar ao mar e o mar à minha terra


Minha terra é aquela pequenina
É Cabo Verde terra minha
Aquela que no mar parece criança
É filha do oceano
É filha do céu
Terra da minha mãe
terra dos meus amores

Bêjo Di Sodade
Onda sagrada di Tejo
Dixám'bejábu bô água
Dixám'dábu um beijo
Um bêjo di mágoa
Um bêjo di sodadi
Pá bô levá mar, pá mar leval'nha terra

Na bôs onda cristalina
Dixám'dábu um beijo
Na bô boca di mimina
Dixám'dábu um beijo óh Tejo
Um bêjo di mágoa
Um bêjo di sodadi
Pá bô levá mar, pá mar leval'nha terra

Nha terra ê quêl piquinino
È Cabo Verde, quêl quê di meu
Terra que na mar parcê minino
È fidjo d'oceano
È fidjo di céu
Terra di nha mãe
Terra di nha cretcheu

Almada Negreiros

estudo cénico Arlequim



Durante um tempo, a arte de Almada Negreiros acompanhou-me, por lugares que faziam parte integrante da minha vida, por isso também será um tema recorrente, aqui, em As Estações do Ano.


segunda-feira, 15 de julho de 2013

Carinhoso | Manuela Azevedo



Música de Pixinguinha, arranjo de José Peixoto e Fernando Júdice, 2002

Faz de conta | Eugénio de Andrade

Faz de conta

- Faz de conta que sou abelha.
- Eu serei a flor mais bela

- Faz de conta que sou cardo.
- Eu serei somente orvalho.

- Faz de conta que sou potro.
- Eu serei sombra em Agosto.

- Faz de conta que sou choupo.
- Eu serei pássaro louco,
pássaro voando e voando
sobre ti vezes sem conta.

- Faz de conta, faz de conta.

Eugénio de Andrade

domingo, 14 de julho de 2013

Liberté, Égalité, Fraternité



Les sans-papiers

Nous sommes
Des étrangers
Des sans-papiers
Des hommes
Et des femmes
Sans domicile
Oh ! Notre-Dame
Et nous te demandons
Asile ! Asile !

 Nous sommes
Des étrangers
Des sans-papiers
Des hommes
Et des femmes
Sans domicile
Oh ! Notre-Dame
Et nous te demandons Asile ! Asile !

 Nous sommes plus de mille
Aux portes de la ville
Et bientôt nous serons
Dix mille et puis cent mille
Nous serons des millions
Qui te demanderons Asile !Asile !
(...)

d' après l' oeuvre de Victor Hugo, Notre Dame de Paris. Paroles, Luc Plamenteau; compositeur, Richard Cocciante et mise-en-scène, Gilles Maheu. Chanté par Luck Mérvil.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Corto Maltese | Hugo Pratt



Conheci esta personagem, assim como muita coisa na minha vida, nos anos 80 e nunca mais a esqueci.

"A liberdade tem de nos custar alguma coisa", e Corto Maltese sabia isso melhor do que ninguém. Percorrendo mares, oceanos e continentes, Corto segue as pistas de Melville, Stevenson e Conrad. Seguir a pista de Corto é iniciar o caminho das grandes aventuras.
Corto Maltese é um herói atípico, elegante, despreocupado. Não procura aventuras, são elas que vêm ter com ele. Homem de acção, apaixonado pela liberdade e pelo humanismo, percorre o mundo caótico do início de século passado à procura de um tesouro ou em busca de um sonho."

Não deixem de o conhecer!

The heart asks pleasure first | Michael Nyman



da banda sonora de O Piano de Jane Campion, 1993

terça-feira, 9 de julho de 2013

Segredo | Miguel Torga

Segredo

Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.

Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar

Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

Miguel Torga

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Ao Sul | António Zambujo




Ao sul
À procura do meu norte
Subo as águas desse rio
Onde a barca dos sentidos
Nunca partiu

Lá longe
Inventei o dia azul
E o desejo de partir
Pelo prazer de chegar
Ao Sul

Cada um tem a sina que tem
Os caminhos são sempre de alguém
Ao Sul

Ao Sul
Entre dois braços abertos
Bate um coração maltês
Que se rende, que se dá
De vez

Por amor
Corto os frutos que criei
Corto os ramos que estendi
Pela raiz que abracei
Ao Sul

Cada um tem a sina que tem
Os caminhos são sempre de alguém
Ao Sul


Composto por João Monge

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Vou onde me leva o vento e não me sinto pensar | Fernando Pessoa

HOJE DE MANHÃ SAÍ MUITO CEDO

Hoje de manhã saí muito cedo,
Por ter acordado ainda mais cedo
E não ter nada que quisesse fazer...

Não sabia que caminho tomar
Mas o vento soprava forte, varria para um lado,
E segui o caminho para onde o vento me soprava nas costas.

Assim tem sido sempre a minha vida, e
Assim quero que possa ser sempre -
Vou onde o vento me leva e não me
Sinto pensar.

Fernando Pessoa

Franz Kafka: inquietante e perturbador

Franz Kafka: inquietante e perturbador mas obrigatório.

    

A Metamorfose (1915) de Kafka por Black Moon Theatre



O Processo ( 1925)  de Kafka por Orson Wells

terça-feira, 2 de julho de 2013

Há mulheres que são maré em noites de tardes e calma | Sophia

O mar dos meus olhos

Há mulheres que trazem o mar nos olhos
Não pela cor
Mas pela vastidão da alma
E trazem a poesia nos dedos e nos sorrisos
Ficam para além do tempo
Como se a maré nunca as levasse
Da praia onde foram felizes
Há mulheres que trazem o mar nos olhos
pela grandeza da imensidão da alma
pelo infinito modo como abarcam as coisas e os Homens...
Há mulheres que são maré em noites de tardes
e calma



segunda-feira, 1 de julho de 2013

Fotografia de cidades | José Luís Peixoto

FOTOGRAFIA DE MADRID

Madrid regressará sempre. São precisos anos
para aprender aquilo que apenas acontece com
a distância de anos. É por isso que posso afirmar
que Madrid regressará sempre. Não sei que tipo
de entendimento encontrámos. Eu e Madrid não
nos conhecemos bem. Sabemos o essencial e
inventamos tudo o resto. Tanto a minha vida,
como a vida de Madrid, já tiveram muitas formas.
No entanto, quando nos encontramos, somos
sempre o mesmo nome. Avaliamo-nos por
cicatrizes e pequenas marcas de idade.
Não estabelecemos metas, estamos cansados.
Eu e Madrid só queremos uma cama, mas,
se não houver, contentamo-nos com o chão e,
se não houver, contentamo-nos com um abraço.




FOTOGRAFIA DE SÃO FRANCISCO 

São Francisco és tu e são as tardes que passávamos 
no sofá, sentados ou deitados de todas as formas, 
em todas as dircções. Não guardo ressentimentos 
de São Francisco e chegará um tempo em que, 
de novo, seremos capazes de passar um fim-de-semana 
entre chapéus de sol e sol. A Califórnia não é eterna, 
mas há um certo tipo de silêncio que se procura sempre
e que se encontra apenas muito raramente. 
Esse é o teu brilho, São Francisco. Vais ver, teremos 
camisas de flores coloridas e saberemos rir-nos 
de tudo. E, contra todas as expetativas, quando 
um de nós estiver a morrer, o outro estará lá.

José Luís Peixoto em Gaveta de papéis, 2008

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Carlos do Carmo | Aprendamos o rito de Saramago




"APRENDAMOS O RITO"

Põe na mesa a toalha adamascada
Traz as rosas mais frescas do jardim
Deita o vinho no copo, corta o pão
Com a faca de prata e de marfim

Alguém veio juntar-se à tua mesa
Alguém a quem não vês mas que pressentes
Cruza as mãos no regaço, não perguntes
Nas perguntas que fazes é que mentes

Prova depois o vinho, come o pão
Rasga a palma da mão no caule agudo
Leva as rosas à fonte, cobre os olhos
Cumpriste o ritual e sabes tudo.

Poema de José Saramago, música de Miguel Ramos

terça-feira, 25 de junho de 2013

Madiba: 'I am the master of my fate: I am the captain of my soul'




INVICTUS  dito por Morgan Freeman

Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find, me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll.
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.

 William Ernest Henley, 1875

segunda-feira, 24 de junho de 2013

domingo, 23 de junho de 2013

sexta-feira, 21 de junho de 2013

VERÃO

Stranglers | Always the sun, 1986

quarta-feira, 19 de junho de 2013

ANAIS NIN

It is possible I never learned the names of birds in order to discover the bird of peace, the bird of paradise, the bird of the soul, the bird of desire. It is possible I avoided learning the names of composers and their music the better to close my eyes and listen to the mystery of all music as an ocean. It may be I have not learned dates in history in order to reach the essence of timelessness. It may be I never learned geography the better to map my own routes and discover my own lands. The unknown was my compass. The unknown was my encyclopedia. The unnamed was my science and progress."

in The Diary of Anais Nin, Vol. 4: 1944-1947